sábado, 20 de abril de 2019

Janis Joplin - (Letícia Araujo)







 "Janis Joplin foi encontrada morta caída no assoalho de um quarto de hotel, com os lábios ensanguentados e 4 dolares e 50 centavos na mão – morte instantânea por overdose de heroína. Seu corpo foi cremado e suas cinzas espalhadas no mar de uma praia californiana"

Não vá !
Em qual outra dimensão te perpetuarás 
senão em nossas almas?
Nelas ainda vibrará tua voz.
A morte te rouba o corpo! 
mas também nossa juventude.
- despedaça-nos!
e não diz o quanto te amamos,
deixa de ti um vazio imenso !
Sem sepultura, tuas cinzas flutuarão nas ondas 
de alguma praia,
e nas tristes águas das lembranças 
vagaremos à tua procura.
Não vá !
Quisera eu impedir tua queda nos braços da eternidade,  
nos meus braços tu continuarias, se eu pudesse !  
Deteria a porta que se abre ampla para dimensões outras,
Tu não transporias agora os umbrais do além túmulo !
Eu não deixaria, se pudesse!
Não vá !
ainda haveria tempo para mais algumas canções.
Em nossa juventude vibrou tua voz,
vibra agora no vazio triste das memórias.
A saudade é uma mortalha miserável e temos que vesti-la,
mas não esqueças nunca dos amores que o teu despertou.
Lá fora brilha um mundo que guardará tua lembrança.
Além das paredes deste quarto tua imagem permanecerá.
Enxuga minhas lágrimas, eu te enxugarei o sangue nos lábios.
Deste hotel eu te levaria para meu lar.
Violão e LPs seriam nossos companheiros.
Em tua veia corria música; ácido? Não !
E agora nada pága por tua falta ! 
o dinheiro que ficou em tua mão ?
Em definitivo nos desencontramos no quarto deste hotel,
e nas águas que lambem a areia de alguma praia 
tuas cinzas se perderão.
Adeus não - até breve !


quinta-feira, 18 de abril de 2019

Kleiton & Kledir / Letícia Araujo (Música e Poema)


Prostituta::

Meus pés não tinham um rumo
- vagueavam vagabundos.
Minha alma não tinha um prumo
- volúvel, vazia, flutuava
Meu corpo não tinha dono
- eu mesma não o possuía.
Mas tinha um preço.
E carregado pelas ondas da aventura
Era navio perdido, sem porto -- meu corpo!
...e afundava em alcovas estranhas.
Meus seios conheceram bocas estrangeiras;
Meus lábios beijaram corpos desconhecidos;
Mãos estranhas me apalparam;
Clientes me procuraram e me tiveram;
Homens vieram e por mim passaram;
Seres que jamais tornarei a ver.

Quando jovem, o mar lambia meus pés,
Voltando agora ao local dos meus vinte anos,
                      - piso a areia -
O mar, reencontrando-me, vem novamente me beijar.
Mas ele não me paga por isso,
Eu que deveria retribuí-lo com meus carinhos.
Mas ele não pede.

Gemidos de prazer - neste momento - não vibram em meus ouvidos.
Agora é o silvar do vento na praia.
Por onde andou e por onde anda a antiga prostituta?

...finalmente dona do próprio corpo,
Retorna ao lar,
Repousando na alcova das fantasias mortas da juventude.


sexta-feira, 12 de abril de 2019

A confissão de Letícia Araujo

 

Padre,
Sonhei que chupava seu falo.
Sim padre...
...sonhei que chupava seu pênis !
No sonho,
na sacristia você estava,
nu e lindo diante de mim.
Não lhe resisti.
Então eu, nua e linda
- contrita - 
ajoelhei-me
para adorar seu membro viril...
...e o chupei !
Confesso aqui padre,
nosso pecado em sonho, 
nossa cumplicidade oculta
nas noites de tálamos oníricos,
nosso sonho de profunda realidade.

Minha boca foi o cálice 
onde você ejaculou cada gota de seu sêmen.
Acordei ainda com o sabor do esperma
que o café matutino desintegrou.


                                           - Letícia Araujo -

terça-feira, 9 de abril de 2019

O Mal era fêmea no século 19 - O Ateneu (Raul Pompeia), Cap. 05

O Ateneu (Raul Pompeia), Cap. 05




(...)

Soavam-me ainda aos ouvidos as prédicas de ascetismo do Barreto.
Para ele o mal era fêmea. 
O Sanches entendia que era macho. Amarrava-lhe um rabo ao cóccix e criava o Satanás bilontra, imoral e alegre. 
A cauda do demônio do Barreto era de rendas. 
Na Rua do Ouvidor, faria o Satanás — fanfreluche. 
Uma coisa horrível, com dois olhos, destinados à perdição dos homens. Saia digna de consideração, só a de padre, que, por sinal, é batina, não é saia. O mais não passava de pretexto da moda parisiense para disfarçar o pé de cabra. 
Cuidado com Satanás sorriso! um sorriso com duas pernas, um abraço com dois seios, uma pantomima do inferno, faceira e traidora, graciosa e comburente, donde por descuido e por acaso vai-se desprendendo a humanidade, como as cobrinhas pirotécnicas de Faraó. O menor descuido, desgraça eterna!
Contou-me que o porteiro do seminário em que estivera, para não ser despedido, fora intimado a separar-se da própria irmã. 
Deus, para vir ao mundo, tinha severamente elaborado o mistério excepcional de uma virgindade sem mancha. 
E, se não fossem as profecias, que não podiam ficar comprometidas, o veículo a Conceição, por amor da insexual pureza, teria sido o carapina José, ou mesmo o velho Zacarias, ainda mais respeitável pela calva.
A teologia do Barreto me calara fundo, e eu resolvera piedoso enxotar quanta imagem de sorriso viesse pousar-me à idéia. 
Virando a página dos fervores, a teoria ficou-me de resto, do Satanás feminino.
(...)